Na última semana, foi revelado o trailer do novo jogo da franquia Assassin's Creed, tendo como protagonistas Yasuke, um retentor da Era Sengoku, que serviu ao senhor de terras Oda Nobunaga, e uma assassina chamada Naoe, uma Kunochi, sendo uma das primeiras vezes na série em que controlamos dois protagonistas.
Mas o que gerou polêmica na internet nos últimos dias desde seu trailer foi o fato de Yasuke ser um samurai negro, levando alguns "fãs", se é que podemos chamá-los assim, a reclamarem de uma inconsistência histórica. E alguns até mesmo dizendo que seria "um desrespeito ter um protagonista não japonês em um jogo que se passa no Japão feudal". Com isso, acho importante ressaltar que Naoe é japonesa, fato que por algum motivo passou despercebido, sendo que somente Yasuke recebeu tais reclamações... e as razões já sabemos.
Esclareço aqui que Yasuke não era, de fato, um samurai no início, pois os samurais eram uma casta a serviço da alta nobreza; logo, seria necessário nascer nesta casta para ser um verdadeiro samurai. No entanto, Yasuke não estava tão distante de ser um, já que fazia parte da guarda do senhor Nobunaga, sendo um retentor, ou seja, um guarda que protegia o senhor Nobunaga, sendo visto por muitos como um samurai naquele primeiro momento. Mas isso logo mudaria.
De acordo com os acadêmicos Thomas Lockley e Geoffrey Girard, após dois meses a serviço de Nobunaga, Yasuke é chamado por seu senhor, e juntos saem com destino ao castelo Azuchi. Nobunaga então o leva a uma nova casa e surpreende Yasuke, dizendo que a moradia foi construída especialmente para ele. Nobunaga lhe concede uma espada e declara que Yasuke era um samurai e membro do clã Oda. Nobunaga seria quem teria dado o nome japonês a Yasuke.
Essas reclamações acerca de Yasuke são inconsistentes, carregadas de uma visão, no mínimo, preconceituosa; já que, apesar da série Assassin's Creed expor muitos fatos históricos com certa "exatidão", como em Assassin's Creed Unity, que retrata a Revolução Francesa, a série ainda dispõe de liberdade poética para muitas coisas, como o fato de Leonardo da Vinci no segundo jogo da série ter participado ativamente para contribuir na ordem dos assassinos, e o protagonista Ezio não ter, de fato, existido na história italiana.
Sabemos que a reclamação de Yasuke não é sobre exatidão histórica nem nada do tipo, mas sim atrelada a essa visão de que as mídias atuais estão buscando apenas agradar essa tal "cultura woke" que tanto chamam, e não porque esse tipo de personagem finalmente tomou um espaço na indústria. Além disso, Yasuke de fato existiu, sendo talvez, até o momento, o personagem mais fiel historicamente dentro da série. E este jogo não é sobre um personagem não japonês ser protagonista da história, já que há Naoe também... mas essa parece ter passado despercebida, pelo visto.
Digo a você, caro leitor, que jogos, filmes e séries têm liberdade poética para abordar temas históricos e fazer as devidas alterações para tornar a história daquele produto mais interessante, já que nenhuma dessas mídias pode ser vista como fonte histórica, nem deve se propor a ser assim. A série Assassin's Creed nunca demonstrou se portar como material histórico, mas sempre foi aclamada por seus grandes acertos. Outros jogos também retrataram protagonistas samurais não japoneses, como o jogo "Nioh", lançado em 2017, tendo um protagonista branco de olhos azuis. Mas esse jogo, por algum motivo, não teve a mesma repercussão.
Por isso eu digo: Yasuke é, sim, válido como protagonista, sendo ótima figura histórica para se abordar e estudar. A Era Sengoku foi uma Era em que o Japão abria suas portas para o mundo e para os estrangeiros, por isso Yasuke existiu naquela época específica, junto com muitas outras figuras não japonesas também. Retratar essa Era não representa o apagamento cultural daquele lugar, mas sim a exaltação da sua história, de um período em que estavam dispostos a conhecer novas culturas e deixar essas o conhecerem também.
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