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Como a A24 mudou minha relação com o cinema

Nicolas R. Aquino












Nascida da ideia de fundar um estúdio próprio durante uma viagem pela autoestrada A24, na Itália, Daniel Katz deu origem à sua produtora, que, inicialmente, se dedicava apenas à distribuição de produções autorais. Com o tempo, a A24 vem ganhando cada vez mais relevância no mercado cinematográfico e conquistando o público, desempenhando um papel significativo na transformação da relação entre as pessoas e o cinema.


Dona de uma curadoria impecável, as produções da A24 são frequentemente mencionadas nas listas de melhores do ano e se destacam nas premiações. Fundada em 2012 por Daniel Katz, David Fenkel e John Hodges, que já tinham experiência no circuito de filmes independentes de Nova York, a distribuidora começou adquirindo filmes em produção ou em festivais, organizando seus lançamentos de forma estratégica.


O segredo do sucesso da produtora está nas escolhas meticulosas dos projetos e dos nomes nos quais investem. Independentemente do retorno de bilheteria, a A24 permite uma liberdade criativa quase total para o desenvolvimento de seus filmes e séries, mantendo a identidade autoral dos seus projetos, o que os diferencia de boa parte do que tem sido lançado pelas grandes produtoras.

Acredito que o primeiro filme da A24 que tive o prazer de ver foi “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”. Como parte do público que não tinha muita noção das barreiras que os blockbusters e as grandes produtoras colocam nas salas de cinema e na divulgação tradicional desses filmes, fui apresentado a essa obra-prima maluca, engraçada e muito inteligente logo após ela ter furado a bolha. Mesmo assim, não foi de primeira que dei uma chance ao filme - não imaginava a grandiosidade do que estava perdendo. Esperei que saísse em algum streaming para dar play, e, assim que o filme ficou disponível no Amazon Prime, tirei uma manhã aleatória para assistir e fui teletransportado para os mundos bizarros, ousados e psicodélicos visitados por Michelle Yeoh.


A experiência de assistir a “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo” foi única. Tive uma mistura de sentimentos; me senti incompetente por não ter entendido e, minutos depois, me senti um gênio por ter entendido. Fiquei alguns bons minutos sentado, olhando para o nada, e pensando: “Caracas, é assim que se faz um bom filme de multiverso; aprende aí, Marvel”. E essa sequência de reações foi se repetindo a cada novo filme da A24 que saía da watchlist do meu Letterboxd e ia para a minha lista dos melhores filmes. Poderia passar horas aqui escrevendo sobre cada experiência específica que tive com esses filmes, mas, como a atenção dos leitores só consegue ser mantida por, em média, 3 minutos, vou relatar apenas os momentos transcendentais que tive com Moonlight, que oficializou minha carteirinha ao culto da A24, e o mais recente adicionado à lista dos melhores filmes que já vi na vida, I Saw the TV Glow.


Cena de Moonlight
Cena de Moonlight (imagem/Reprodução: A24)

Em Moonlight, acompanhamos três momentos da vida de Chiron, um jovem negro morador de uma comunidade pobre de Miami. Passando pela infância, adolescência e vida adulta de Chiron, somos transportados para uma narrativa repleta de sentimentos, sensações, subtextos, vivências, bullying, homofobia, aceitação, drogas, enfim, a vida de Chiron, por mais difícil que seja, nos é apresentada por meio de uma fotografia magnífica, uma trilha sonora com direito a Caetano Veloso e o uso do neon em cenas impressionantes, que nos entregam uma história intimista e totalmente relacionável. Sendo o filme mais barato a ganhar o Oscar de Melhor Filme, Moonlight tem a cara da A24, ao mesmo tempo que o filme é totalmente único por si só.


Agora, o mais novo “terror” lançado pela A24, é um daqueles filmes que dividem opiniões, tendo aqueles que amam e aqueles que odeiam. Logicamente, faço parte do time que ama e idolatra esse filme por toda a sua genialidade e construção confusa. O longa segue Owen, um adolescente que, após fazer amizade com uma aluna mais velha da escola, é apresentado a um tosco programa de TV pelo qual ele desenvolve uma fixação e dependência nada saudáveis. Eu sei, é estranho e parece bobo, e de fato, em uma primeira leitura, é só isso mesmo que fica do filme, mas, quando entramos em todas as nuances e paralelos dos medos da vida adulta, nas descobertas de sexualidade e gênero, no medo de decepcionar os outros, o filme, novamente com sua fotografia e cores neon, ganha um significado muito maior, e você nunca mais verá a frase “Ainda dá tempo” da mesma forma.


Bom, que sou um grande fã da A24 já ficou óbvio. Não só como cinéfilo, mas também como estudante de comunicação que acha incrível como a produtora usa as redes sociais e as mídias não tradicionais para promover seus filmes. Embora não tenha dito diretamente como suas produções mudaram minha relação com o cinema, digo abertamente aqui que passar por essas experiências foi muito necessário para o desenvolvimento do meu senso crítico, além de ter me feito ser mais aberto a produções que vão além dos filmes que ocupam mais da metade das salas de cinema.


Os filmes mencionados acima foram de suma importância para que eu percebesse que além do entretenimento, a experiência de ver um longa é capaz de te despertar sentimentos, atiçar a curiosidade, brincar com suas percepções e se tornar algo marcante, algo que as vezes vai se pegar pensando aleatoriamente da mensagem passada durante aquelas duas horas. Agradeço aos filmes da A24 por sempre me apresentarem algo novo, muitas vezes bizarro e principalmente reflexivo. Deixo o convite àqueles que queiram conhecer o trabalho dessa magnífica produtora: faça como eu, vá sem esperar nada e escolha o filme que, em qualquer outra situação, você não assistiria.


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