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Foto do escritorStella D'Avansso

Especular viagens no tempo e suas infinitas possibilidades

Stella Talita












Delinear (com a imaginação) um tempo acontecendo em um determinado espaço é olhar para uma direção. As memórias que temos sobre as coisas foram condicionadas pelas nossas experiências, seja pelas identidades que carregamos ou até mesmo o repertório adquirido para a interpretação dos fenômenos. Pensar viagem no tempo, então, é pensar em como o mundo se organiza (ou se organizará) durante aquele tempo.


Minha memória constrói a imagem da cidade que vivi, cheia de atividade industrial, fumaça, prédios altos sem janelas, sinais de fábrica. Minha relação com a Ficção Científica se deu nesse universo de extrema atividade da ciência e da técnica. Os primeiros filmes de sci-fi foram apresentados pelo meu pai, mas a ficção científica estava por todo lugar na minha vida, na televisão, no cinema, nos quadrinhos e, finalmente, nos livros.


O físico teórico John Wheeler disse: "O tempo veste um traje diferente para cada papel que desempenha em nosso pensamento."

Quando somos crianças o tempo corre de forma não linear e aos poucos entendemos o que significa essa experiência temporal. Para uma menina que amava a franquia "De Volta para o Futuro" de Robert Zemeckis, era um absurdo assistir a filmagem do casamento dos pais e não lembrar de estar ali, mesmo depois de pacientemente os adultos explicarem que uma pessoa não poderia comparecer em um evento antes do seu nascimento.


Minha memória formula quando entendi o tempo pela primeira vez, ele realmente só ia pra frente. Mas mais do que isso, assim como em O Fim da Eternidade de Isaac Asimov (meu livro de cabeceira aos16), a forma como lembramos e moldamos o passado na imaginação define mais o futuro do que as ações do presente isoladas, como ideias sobre períodos históricos.


Minha memória traz de volta o terceiro filme De Volta para o Futuro, quando o Dr. Emmett Brown e Marty McFly viajam no tempo mais uma vez, mas para1885. Eu não sabia muito o que significava imaginar existir no século XIX (e nem todo filme de viagem no tempo é acurado em detalhes históricos), mas realmente acreditei que aquela era uma viagem segura para mim também. O filme definiu aquele momento da história no meu imaginário com aventuras, hábitos culturais estranhos já abandonados e homens bons que derrotam homens maus.


Eu entendi mais tarde que o tempo também marca a forma como as sociedades pensam, agem e são atingidas por essas ações. Com Kindred: Laços de Sangue de Octavia Butler minha memória traz um outro século XIX. Dana (a protagonista) tem uma grande experiência com o tempo e aprende que para alguns de nós o passado é uma dor que nem sabíamos que estava presente. Durante a leitura, só conseguia pensar (com horror) o quanto a narrativa batia com algumas histórias de vida da mãe da minha bisavó, chegadas até mim de geração em geração. Na obra, a escravidão se torna um passado mais real e palpável que as aventuras de um cientista branco em uma terra que contempla todas as suas fantasias.



Imagem da série "Kindred", ainda não disponível no Brasil
Imagem da série "Kindred", ainda não disponível no Brasil

Minha memória, então, projeta em minha mente a última definição que meu pensamento criou para o tempo, totalmente influenciado pelas minhas histórias de ficção científica preferidas: tenho tido memórias, algumas eu vivi, algumas não são minhas e não são boas, mas me trouxeram até aqui como os ancestrais de Dana a trouxeram em Kindred, algumas memórias são imperfeitas, mas felizes, como a cor esquisita e fascinante do pôr do sol em uma região com muita poluição. Eu percebo as coisas, um dia cheias de vida, irem embora, desgastarem ou morrerem e, assim como Nöys e Andrew Harlan perceberam na conclusão de O Fim da Eternidade, entendo que para o bem de todos nós o tempo não define a eternidade de uma única realidade, mas um infinito de possibilidades.


Prontos para especularmos juntos?










119 visualizações3 comentários

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3件のコメント


ゲスト
7月26日

O interessante do seu texto é que me evoca o papel da memória.

A memória, assim como a arte, é a forma como a humanidade viaja no tempo. A memória é revolucionaria, a memória é subversiva. Entretanto, em breve todas pessoas que viveram a segunda guerra mundial ou a ditatura de 64 por exemplo terão morrido e essas memórias estarão em risco, e por isso se faz importante não apenas documentos históricos e registros da época, mas arte e memes (no sentido de R.Dawkins) que mantenham a memoria viva (mesmo quando o indivíduo morrer) e o aprendizado relevante. Fatos e documentos tem importância técnica, mas a memória tem importância para o individuo e para o autoconhecimento de uma sociedade.

O…

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Excelente texto, e de fato, o conceito de tempo é tão complexo por si só que para entendermos, essas obras de ficção científica são ideais, principalmente para auxiliar na formação do pensamento! PS: Kindred é um livro fantástico, muito doloroso, porém, muito importante para se pensar nessas relações geracionais passadas e o impacto delas hoje em dia.

編集済み
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ゲスト
7月17日

Incrível como a percepção do tempo varia conforme ele passa e altera a maneira como enxergamos a vida. É preciso coragem para encarar novos tempos e, mais do que isso, fazer valer a pena cada segundo de nossa passagem no mundo, seja ele o da imaginação ou físico.

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