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Jovens são o terror de "Fale Comigo"

Atualizado: 2 de jun.

Matheus Maciel












Filmes de alegoria costumam acabar girando em círculos, correndo atrás do próprio rabo. Não é incomum a direção e o roteiro de uma película perderem-se de tanto circunavegar em torno da própria narrativa metafórica, a ponto tornar o filme enfadonho. Bem, se você estava esperando que eu citasse aqui algum filme desses, pode ir tirando o cavalinho da chuva! Não quero comprar briga fácil assim. O que eu trouxe hoje para uma breve review foi um filme que conseguiu escapar dos clichês da alegoria e nos envolver em sua proposta. Falo do longa Fale Comigo, de 2022, dirigido pelos irmãos Michael e Danny Philippou.


Antes de começar falando da obra propriamente dita, gostaria de ressaltar que os irmãos iniciaram sua carreira audiovisual na plataforma mais famosa de vídeos da internet, o YouTube. Essa informação é interessante na medida em que o YouTube entrou para o mapa da cinematografia por, pelo menos nas últimas duas décadas, ter dado espaço para um sem fim de produções e realizadores criativos que dificilmente poderiam angariar espaço em uma produtora de cinema tradicional. Esse é o caso dos irmãos australianos Philippou, que iniciaram fazendo curtas na plataforma, e logo sua proposta cinematográfica foi abraçada pela afamada produtora A24. 


Rasgação de seda à parte, o que me intriga em Fale Comigo é uma presença, talvez um tanto tímida, de certa orientação estética e mote típicos do YouTube no longa. Eu creio não conseguir explicar melhor essa parte, mas juro que senti que via um grande curta de terror - isto é um elogio -  do YouTube ao ver o filme, mesmo antes de saber da origem dos irmãos diretores! Se você já assistiu Marble Hornets (2009 - 2014), sabe do que estou falando. Se não viu ainda, a série está disponível na íntegra na plataforma, vale a conferida.



Sobre o filme, ele trata da história de Mia (interpretada por Sophie Wilde), uma jovem com um passado carregado de tragédia, o qual ainda não conseguiu superar. Certo dia, ela e sua amiga Hayley (Zoe Terakes), juntamente com seu irmão Riley (Joe Bird), vão a uma dessas festas típicas de jovens estadunidenses, onde todos bebem, flertam e fazem bobagem. Olha, no caso de Fale Comigo, bota bobagem nisso, porque o diferencial dessa festa em particular, é que os jovens têm uma experiência sobrenatural.


Não, não estou falando de tabuleiro ouija, ou jogo do copo, mas de uma mão, supostamente de uma bruxa, embalsamada e toda riscada igual um gesso ortopédico, quando todo mundo fica querendo assinar. A propriedade sobrenatural da mão é conseguir fazer a pessoa ser possuída por um espírito, de forma voluntária. A possessão, no entanto, tem limite de tempo, e logo o espírito vai embora. A alegoria que falei no começo da coluna torna-se clara neste ponto do filme: o uso de drogas por parte de jovens, principalmente em contexto de festas caseiras. Apesar da alegoria ser cristalizada no texto do longa, ou seja, ela apenas substitui o uso de drogas para a razão de alegoria, sendo possível falar diretamente do assunto e chegar-se, basicamente, ao mesmo lugar, ela ainda tem seu valor. 


Primeiramente, vale como ingresso para classificar o filme como uma obra de terror. Não que isso seja meramente ilustrativo e taxativo, na verdade, o uso da mão subverte com louvor o já tão batido tropo da “possessão” no gênero, tendo em vista que os jovens a usam para “curtir uma brisa”, ainda que macabra.


Por fim, vi o uso da alegoria da mão como uma conexão interessante e agradável de acompanhar, em termos narrativos, entre gerações. A geração mais nova vai, é claro, identificar-se com os personagens e situações que se desenrolam no filme, além de, possivelmente, capturarem a tal “aura de YouTube” que falei anteriormente. Não se enganem, isto não é apenas modernidade por modernidade, pois fica evidente que os realizadores colocaram carinho e bastante pessoalidade nas cenas, de modo que haja identidade do espectador mais novo com cada elemento. Os mais velhos, por sua vez, poderão sentir um frescor e se divertir com a flexibilização do gênero que ficou popular lá atrás, com O Exorcista (1973), além de captarem pontes que possam conectá-los melhor ao mais jovens, por estarem diretamente na pele deles ao assistirem o filme.

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