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Não precisa amar pra casar: uma reflexão sobre as diferenças entre 'amor' e casamento na Grécia Antiga 

Julia de Alencar, colunista








Quando se fala de amor e casamento, podemos reparar que os gregos antigos tinham perspectivas específicas sobre esses temas, mas de forma bastante contrastantes com as da atualidade.  O povo heleno, como alguns outros povos da antiguidade, não enxergava o casamento como uma instituição cujo fator determinante fosse o amor romântico. Nesse sentido, já adianto que logo de inicio abordarei brevemente estas as diferenças, isto é, o conceito moderno de casamento e amor associado aos mitos e às tradições que os concretizaram assim. 


"O amor é um desejo de possuir a beleza eterna e imortal, que nos inspira a buscar a perfeição e a excelência em todas as coisas." - Platão, "O Banquete

Na tradição grega antiga, o casamento não era como entendemos hoje, focando menos no romance e mais em aspectos sociais e práticos. O casamento era mais sobre alianças familiares do que sobre amor romântico, e a mulher desempenhava um papel importante nas sociedades, moldando as práticas matrimoniais. Nesse sentido, as cerimônias envolviam fases de desafio, transferência e transformação, seguidas por alguns rituais, como o Gamos, que incluía a purificação, o Banquete e o ritual da Câmara Nupcial.


Os ritos e particularidades tradicionais dos ritos helenos são melhor descritos no post União/Casamentos, do blog HelenosBr


Mesmo em suas tradições, ficava razoavelmente claro que os antigos gregos viam o casamento como uma instituição não dual, mas coletiva, em específico, familiar. Nesse contexto, o amor romântico muitas vezes não tinha o destaque que encontramos em nossas narrativas contemporâneas. Em vez disso, as relações eram moldadas por considerações práticas e sociais.


Mas os gregos não eram totalmente alheios à perspectiva 'amor romântico'. Isso fica mais evidente nos mitos e na filosofia, além de ser evidenciado pelos comportamentos da pólis, de forma que relacionamentos homoafetivos (principalmente relacionamentos aquilianos) eram  bastante encorajados. Na Grécia Antiga, não havia termos como heterossexualidade ou homossexualidade para classificar as preferências sexuais das pessoas. Os relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo eram comuns, principalmente entre homens em Atenas, Esparta, Creta e Tebas.


"O amor verdadeiro é capaz de enfrentar os desafios mais difíceis. Juntos, podemos superar qualquer obstáculo, minha querida." - Eros para Psiquê, durante suas provações.

Como foi dito anteriormente, a mitologia grega também trata sobre o amor e o casamento. Um dos mais importantes exemplos é o mito de Orfeu e Eurídice, que explora os limites do amor e da perda. Orfeu, o habilidoso músico, desce ao submundo para tentar resgatar sua amada, Eurídice, da morte. No entanto, seu fracasso em seguir as instruções específicas resulta na perda definitiva de Eurídice. Este mito revela as complexidades do amor e a dor da separação, mas também sugere que mesmo os esforços mais heróicos podem ser em vão.


Assim como o mito de Orfeu e Eurídice, o mito de Eros e Psiquê também é uma narrativa marcante da mitologia grega que trata de amor e superação de desafios. Eros, o deus do amor, se apaixona por Psiquê, uma mortal, desencadeando uma série de eventos (provações) que testam sua relação. A história envolve provas e sacrifícios que Psiquê enfrenta para provar seu amor por Eros, lembrando-nos do poder do amor para superar obstáculos.


Vale ressaltar que para os gregos antigos, o amor, conhecido como "Éros", era uma força poderosa que transcendia a atração física e o romance. Era visto como uma energia que impulsionava os indivíduos a buscar a excelência e a beleza, tanto na arte quanto na vida. O amor grego era multifacetado, envolvendo diferentes formas de conexão emocional, desde o amor entre amigos e familiares até o amor entre amantes. Além disso, o amor era muitas vezes associado ao desejo de transcendência espiritual e à busca pela sabedoria e conhecimento.


Por isso que é possível traçar uma certa separação entre o formal (casamento) e o sentimental (amor/eros). Enquanto que o casamento na Grécia Antiga era mais sobre estabilidade social e alianças familiares, a visão moderna, muitas vezes baseada em valores cristãos, coloca o amor romântico como a pedra angular da instituição matrimonial.


Por isso podemos dizer que o verdadeiro amor não conhece limites de gênero, status ou tradição, por não estar vinculado a uma ritualística/formalidade social; e é essa força dinâmica e inclusiva que devemos valorizar e celebrar em nossa jornada pela busca da felicidade e da realização pessoal.




Referências:

VRISSIMTZIS, Nikos. Amor, Sexo & Casamento na Grécia Antiga. São Paulo:

Odysseus, 2002.

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