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O Helenismo e Eu

Julia de Alencar, colunista de Mitologia










Você já sentiu apreço por algo que você ainda não conhece? Uma sensação inexplicável, de familiaridade? Algo como uma casa longe de casa? Eu me sinto assim sobre algumas coisas, mas há pouquíssimo que me faça sentir totalmente feliz e conectada comigo mesma quanto a Grécia. 


Existe um termo para pessoas que, assim como eu, se encantam pela cultura e pela história desse país tão antigo e tão cheio de riquezas: Fileleno. Adjetivo, substantivo masculino. Que, ou quem se interessa pelas coisas gregas. Que, ou quem é amigo dos gregos modernos. Etimologia (origem da palavra fileleno). Do grego philéllen. 


O intuito desse texto é me apresentar formalmente e contextualizá-los do porquê de eu ter uma coluna dedicada a um tema tão expatriado. Prazer, meu nome é Júlia Lucena de Alencar, tenho 21 anos e posso dizer, com muito orgulho, que sou uma filelena. 


Eu não me lembro ao certo quando esse fascínio começou, mas é tão natural que é como se eu tivesse nascido com ele. Eu acredito que a primeira influência “grega”, ou pelo menos “grega adjacente”, que tive foi o filme “Hércules” da Disney. Eu era bem criança quando assisti o filme pela primeira vez, então as críticas feitas no último post passaram totalmente despercebidas pela minha cabecinha infantil (você pode ler o post da semana passada clicando aqui). Eu fiquei maravilhada com a história, com as músicas e com as referências culturais helênicas. Desde pequena eu sempre gostei muito de saber a história por trás das histórias


Logo eu comecei a ir atrás de algumas referências, mas não explorei verdadeiramente esse assunto até os meus nove ou dez anos de idade. Um dia na escola, tive uma aula sobre a Grécia Antiga; o professor falou de forma generalizada sobre a polis grega, os patrícios e a formação política, mas também citou os Deuses e a mitologia. Eu nem preciso dizer qual foi a parte que realmente me fascinou, né? Desde então eu comecei a pesquisar sem parar sobre os Deuses e os seus mitos. Fiquei completamente vidrada no universo que os helenos me apresentaram. 


E, então, como todo jovem fã de mitologia grega, eu me deparei com Percy Jackson. O filme, infelizmente. Quem conhece o universo literário de Rick Riordan sabe o quão rico é em diversidade, referências mitológicas e à cultura pop; como tem uma escrita leve, cheia de piadas e diálogos interessantes.


Mas, minha sorte foi ter o ímpeto de querer mais... então, assim que assisti o primeiro filme, arrastei minha mãe para a livraria mais próxima e comprei toda a primeira saga: “Percy Jackson e os Olimpianos”. Eu não tinha um hábito de leitura tão bem desenvolvido quanto gosto de pensar, levava muito tempo pra ler um livro de verdade. Mas para a minha surpresa, levei apenas dois meses pra ler a saga inteira. 


Eu fiquei obcecada! Vou usar uma alegoria que minha mãe usou várias vezes ao descrever o porquê de amar tanto o desenho animado da “Liga da Justiça”: Eram todos os caras juntos! Era absurdo, era incrível demais! No Acampamento Meio-Sangue tinha um chalé pra cada um dos personagens principais da maioria dos mitos, foi uma revelação brilhante para mim acompanhar o progresso do herói Perseu ‘Percy’ Jackson durante seus primeiros anos após descobrir que era um semideus. 


Dali pra frente eu não parei mais, levei o estudo dos mitos mais a sério e comecei a me inteirar de verdade nas histórias. Conhecer os Deuses profundamente era a minha maior vontade. E eu fiz o possível no que competia à mitologia. Virei praticamente uma enciclopédia mitológica, mas ainda me faltavam algumas coisas. 


Desde a infância, ainda por influência da Disney, me tornei uma grande fã de musicais. Conheci Grease na mesma época em que tive a primeira aula sobre a Grécia Antiga, mas já conhecia A Noviça Rebelde, High School Musical, Footloose e O Fantasma da Ópera... o último só de nome. Mas, em geral, não assisti muitos filmes de musical nem nada até o fim do ensino fundamental, quando fiquei obcecada pela produção cinematográfica de Os Miseráveis. Sei a maioria das músicas de cor até hoje. Mas, mais uma vez eu meio que empaquei no mesmo lugar, fiquei mais um ou dois anos sem saber de qualquer musical novo. Até que, graças à recomendação de uma amiga, eu decidi assistir “Mamma Mia!” pela primeira vez. E foi aí que eu finalmente me considerei totalmente entregue às graças e encantos daquele lugar. 


A partir daí, a Grécia me parecia uma terra de contos de fadas, um lugar feito de sonhos, fantasia, heroísmo, coragem e muito, muito amor. Eu resgatei muito do mesmo deslumbre que eu tive no meu primeiro contato com a cultura helênica, até porque apesar de as histórias serem completamente diferentes em questões de enredo, são contadas num formato extremamente semelhante. Então, além de dar continuidade ao estudo da mitologia, eu comecei a buscar por musicais com essa temática; então conheci Hércules, Hadestown, The Lightning Thief e, mais recentemente, EPIC. 


Estudei um pouquinho da filosofia grega na escola e definitivamente os filósofos gregos compõem a parte majoritária dos meus filósofos favoritos, sendo Platão o meu favorito entre eles. Ele acabou se tornando meu favorito por citar os Deuses com bastante frequência. Em diálogos como "A República" e "O Sofista", ele fala sobre a natureza dos Deuses, fala sobre seu papel na sociedade e os utiliza de exemplos em argumentos filosóficos, apesar de nunca colocá-los como reais ou como parte de sua crença. O que ele disse em sua obra "O Banquete" sobre amor dialogou muito comigo também, porque nesse discurso ele aborda a busca por amor, Eros, como aspiração por beleza e sabedoria. No fim das contas, dizendo que o amor é como uma busca pela vida eterna e por sentir uma conexão com algo maior, com o divino.


Isso foi parte do porquê de eu ter iniciado a minha jornada religiosa também. Eu buscava por identificação em todas as áreas da minha vida, e apesar de  ter sido criada na fé cristã, eu não me identificava com muito do que estava presente nela. Eu tentei, garanto. Estudei a bíblia da mesma forma que estudava a mitologia grega; eu gostava de conhecer o máximo possível por trás dos fundamentos das coisas, então a leitura não foi nem um pouco difícil. Mas, ainda assim, algo não se encaixava em mim. O novo testamento era a parte mais interessante, principalmente pelas semelhanças que notei entre Jesus e Dionísio, porém nada me causava o mesmo tipo de conexão. 


Eu considerava o catolicismo muito restritivo; eu não gostava da ideia de me adequar a uma religião e abandonar traços importantes da minha identidade em prol dela. Então, comecei a estudar outras religiões. Pesquisei sobre o Espiritismo Kardecista, sobre o Budismo, sobre a Wicca e a Bruxaria Natural. Achei pontos interessantes em todas, mas ainda não conseguia me identificar com nenhuma, até finalmente ouvir falar sobre o Reconstrucionismo Helênico.


Eu fiquei maravilhada! Mais uma vez eu fui levada àquele lugar tão mágico e maravilhoso: Hélade. Eu comecei a estudar sobre os hinos, os rituais, as oferendas, os altares, os epítetos; E finalmente consegui o que eu tanto queria desde a infância: me sentir em casa com a minha própria fé. 


Minha jornada com o Helenismo ainda está só começando. Recentemente comecei um curso de grego moderno e ainda estudo muito sobre a prática da minha religião, sobre os mitos e a cultura helênica. Esta coluna foi um convite a falar sobre um dos meus temas favoritos sim, mas também um incentivo a nunca deixar de tentar aprender o máximo possível sobre ele. Eu gostaria então, de agradecê-los, meus caros leitores, por me acompanharem nessa jornada. Este é apenas o começo. 


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