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O uso de narrativas sombrias como forma de denunciar violências vividas pelas mulheres

Vitoria Martins










Quando pensamos em narrativas sombrias, imediatamente pensamos em histórias de suspense, tensas e que beiram ao terror, e esse é mesmo o seu significado. No entanto, significado de “sombrio” vai muito além do dito. Um movimento que sempre existiu na literatura, e que para sempre deve continuar, é a escrita de histórias ficcionais que contam situações ocorridas na vida real. Essa é uma ferramenta tanto de denúncia quanto de representação das dores vividas. Na escrita feminina, isso aparece com certa frequência em histórias que falam sobre relacionamentos tóxicos, violência doméstica (física ou psicológica), preconceitos, entre outras formas de expressar o cotidiano vivido.


E onde o sombrio entra nisso tudo? O primeiro livro que me fez questionar isso foi Contos Sombrios de Camila Fernandes, livro que conheci por acaso em um minicurso literário sobre “Figurações de personagens monstruosas na literatura de autoria feminina”. A partir daí, fui ler o livro completo e me deparei com histórias narradas como sombrias, com elementos do fantástico e do gótico (como vampiros, entre outros), mas que contavam histórias muito próximas das diversas violências vividas por mulheres todos os dias.


Esse foi o momento que me fez refletir sobre obras que não são vistas como sombrias, mas que apresentam todos os elementos que podem fazer uma mulher sentir que, na verdade, ela é, já que uma história sombria pode envolver tristeza, melancolia, futuro desesperador, más intenções, desesperança, trevas, infelicidade, entre outros. Então, como não pensar em livros como O peso do pássaro morto de Aline Bei, ou Olhos D’Água de Conceição Evaristo? Como ler sobre as diversas violências que as protagonistas sofrem ao longo da narrativa e não vou pensar que isso é uma história sombria? Falar sobre as violências vividas pelas mulheres dentro de uma narrativa sempre vai tornar aquela história sombria para quem sente, quem se identifica e quem fica com medo de passar por isso um dia.

Camila Morgado vive Janete, personagem da série brasileira Bom Dia Verônica. Na série, personagem tenta denunciar os abusos do marido, mas acaba revelando que as problemáticas do parceiro eram potencialmente violentas com mulheres para além do casamento. (Foto: Divulgação Netflix)

Na ficção como um todo, assim como, na literatura, é potente o lugar de questionamento e denuncia, onde se pode mostrar o quanto é sombrio viver cercada de violência de gênero. É importante usar essa ferramenta narrativa como instrumento de mudança. Isso, infelizmente, só poderá ser feito quando a ficção não precisar mais contar vidas sombrias para representar a vida real.

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